A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, manteve a determinação que a fazenda lindeira ao Assentamento Lagoa do Junco, no interior do município de Tapes (RS), interrompa as pulverizações aéreas de agrotóxicos na localidade.
A decisão é decorrente de ação civil pública ajuizada pelo Instituto Preservar, associação civil sem fins lucrativos, que reúne agricultores/as, educadores/as e pesquisadores/as em defesa da agroecologia e do modo de vida camponês.
A ação foi ajuizada em razão de danos causados pela deriva de agrotóxicos – clomazone e glifosato – por meio da pulverização aérea desses produtos pela fazenda lindeira ao assentamento em outubro de 2022.
Em março de 2023 a magistrada da 9ª Vara Federal de Porto Alegre, ao analisar o pedido de tutela de urgência, havia concedido o pedido liminar, determinando a suspensão da pulverização aérea até a apresentação das contestações. Posteriormente, indeferiu a extensão dos efeitos da suspensão da pulverização aérea.
Na sessão de julgamento do dia 24 de setembro (terça-feira), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, após ouvir os advogados e o representante do Ministério Público Federal, analisou o recurso da entidade autora. Ao apreciar os argumentos e os elementos probatórios dos autos, entendeu pela necessidade da suspensão da pulverização aérea de agrotóxicos no local até a prolação da sentença de primeiro grau.
A 3ª Turma do TRF4 considerou que “há a probabilidade razoável sobre a potencial ocorrência de danos sérios ou irreversíveis ao meio ambiente” de tal modo que a aplicação dos princípios da prevenção e da precaução ambiental, em razão do relevante corpo probatório levado aos autos da Ação Civil Pública.
Na ocasião do julgamento, o Ministério Público Federal, valendo-se da sua condição de fiscal da lei, se posicionou favorável ao pedido formulado pelo entidade da sociedade civil, ao ponderar que os danos ambientais percebidos no local são extremamente graves e preocupantes, e que tem a capacidade de causar severos danos à saúde e às culturas orgânicas extremamente sensíveis a agrotóxicos, entendeu razoável e proporcional a medida de suspensão da pulverização aérea no local.
Segundo o advogado do Instituto Preservar, Thales Zendron Miola, a prática poluiu áreas de preservação permanente, mananciais de água, a residência dos assentados e provocando prejuízos na produção orgânica de arroz e hortaliças do Assentamento Lagoa do Junco, que é lindeiro à fazenda que realizou a pulverização aérea de agrotóxicos. Em virtude da contaminação, o assentamento ficou impedido pelo Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) de comercializar a produção nos meses subsequentes à contaminação:
Trata-se de uma decisão extremamente importante, pois determina a suspensão da pulverização aérea de agrotóxicos no entorno do assentamento, como forma de efetivar princípios básicos que regem o direito ambiental brasileiro, como o princípio da prevenção e precaução. É uma medida extremamente necessária em tempos atuais em que a devastação do meio ambiente ecologicamente equilibrado alcança índices alarmantes e praticamente irreversíveis.
Além disso, a decisão efetivamente garante proteção à saúde e ao direito ao trabalho digno às famílias que produzem alimentos sem veneno para a merenda escolar e feiras ecológicas de toda a região.
A Ação Civil Pública segue tramitando na 9ª Vara Federal de Porto Alegre e, além da interrupção definitiva da prática na localidade, a ação ainda pede que os entes públicos criem mecanismos de fiscalização e estabeleçam polígonos de exclusão de pulverização aérea, ou seja, áreas em que a pulverização de agrotóxicos por aviões seja proibida, já que as partículas se dispersam no ar e atingem outras propriedades.
É necessária a criação e efetivação de mecanismos de fiscalização dessa prática extremamente nociva ao meio ambiente e à saúde humana, ainda mais essa região do estado do Rio Grande do Sul em que as condições geográficas e climáticas são extremamente propícias à ocorrência de derivas decorrentes de pulverização aérea de agrotóxicos.
O assentamento Lagoa do Junco, que possui certificação de cultivo orgânico pela COCEARGS, faz parte do grupo de assentamentos da reforma agrária responsável pela maior produção de arroz agroecológico da América Latina. Além dos proprietários da fazenda lindeira ao assentamento, são réus no processo a União, o Estado, a Fepam, a Emater, a empresa de pulverização aérea e as multinacionais que produzem os agrotóxicos.