Brasil vive ‘uma das maiores tragédias do mundo’ com escalada de venenos, alerta Campanha Contra Agrotóxicos

País libera venenos sem capacidade de monitorar, mantém alta contaminação e enfrenta ofensiva do agronegócio

Dia Mundial de Luta Contra os Agrotóxicos é celebrado nesta quarta-feira (3)
Dia Mundial de Luta Contra os Agrotóxicos é celebrado nesta quarta-feira (3). | Crédito: Freepik

Por Adele Robichez E Lucas Krupacz E Nara Lacerda
Do Brasil de Fato

No Dia Mundial de Luta Contra os Agrotóxicos, celebrado nesta quarta-feira (3), a coordenadora da Campanha Nacional contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Jakeline Pivato, reforçou que “não é um dia de comemoração”. Em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, ela classificou o avanço do uso de agrotóxicos no Brasil como “uma das maiores tragédias do mundo nesse contexto”.

A data é marcada pela memória da tragédia de Bhopal, na Índia, em 1984. Na época, um vazamento de gases tóxicos na fábrica de pesticidas da Union Carbide matou milhares de pessoas e deixou outras centenas de milhares com sequelas. Para Pivato, o marco é importante também para lembrarmos que “a situação dos agrotóxicos, em especial nos países do Sul Global, tem se tornado cada vez mais grave”.

A coordenadora destacou que “há uma contaminação permanente no ar, na água, no solo e nos nossos alimentos”. Segundo ela, comunidades indígenas, quilombolas e populações rurais estão entre os grupos mais atingidos. “As pessoas têm suas produções, suas casas, suas escolas pulverizadas com essas substâncias que são extremamente tóxicas, que são comprovadamente causadoras de câncer, má formações”, relatou.

Para a campanha, a data também serve para ampliar articulações e reforçar denúncias. “O Dia Mundial de Combate aos Agrotóxicos serve para manter permanente nas nossas memórias, reforçar as nossas pautas atuais e articular os territórios no nível mundo. Essa luta ultrapassa fronteiras”, afirmou Pivato.

Maior risco, menor fiscalização

Questionada sobre a Lei 14.785/2023, conhecida como Lei do Veneno, ela apontou que o novo marco tende a aumentar os riscos à saúde e fragilizar a fiscalização. “Nós temos os dez venenos mais utilizados no nosso país já banidos ou até mesmo nunca liberados em outros países”, afirmou.

Além disso, o Brasil permite concentrações mais altas do que outros mercados. “O índice de permissão dentro da legislação brasileira ainda é muito alto”, criticou a coordenadora. Segundo Pivato, a exposição atinge trabalhadores rurais, populações vizinhas ao agronegócio e consumidores, inclusive com “presença desses agrotóxicos em ultraprocessados, em cosméticos”.

Ela também denunciou lacunas de controle e pesquisa. “Nós temos um pouco de pouco controle no que diz respeito a laboratórios com capacidade de pesquisa”, indicou, alertando que o país “libera substâncias que nós não somos capazes de fiscalizar e muito menos de responder o que elas, de fato, vão causar.”

Lobby do agro x mobilização social

Para Pivato, a influência do agronegócio no Congresso tem aprofundado o problema. “A produção de alimento saudável é bastante contraditória, para não dizer praticamente inviável, porque solos e águas já estão contaminados e os territórios dominados pelo agro”, apontou.

A coordenadora aposta na mobilização social para frear retrocessos, especialmente diante do “agronegócio dominando todo o Congresso” e a ameaça ao Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara), criado por decreto do governo federal. “Se não nos alertarmos, não nos organizarmos, corremos um risco muito grave de perder o Pronara, que foi uma conquista de mais de dez anos”, disse.

Ao mesmo tempo, ela destacou que a agroecologia tem avançado, apesar da desigualdade estrutural. “Os territórios de resistência têm cada vez mais compreendido o seu papel e se fortalecido”, avaliou. Como exemplos, ela citou o congresso realizado na Bahia e a presença do movimento na Cúpula dos Povos na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30).

“Só a agroecologia vai ser capaz de tirar a raça humana desse âmbito de crise climática, ambiental e de todo esse universo de contaminação”, defendeu Pivato. Para mudar o cenário, concluiu, é preciso ampliar comunicação e mobilização. “Precisamos avançar na nossa capacidade de botar povo na rua para defender as nossas pautas e defender os nossos territórios”, pontuou.

Para ouvir e assistir

O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira: a primeira às 9h e a segunda às 17h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.

Editado por: Nathallia Fonseca

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