Por Roberta Quintino l Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida
Na manhã desta quarta-feira, 13, a Comissão de Cooperação e Desenvolvimento Econômico do Parlamento Alemão realizou uma audiência pública sobre o tema “Exportação, uso, benefícios e efeitos colaterais dos agrotóxicos não autorizados na União Europeia”. A convite do Partido Verde, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, que desde sua fundação tem como bandeira o banimento dos agrotóxicos proibidos na União Europeia, participou da atividade.
Representada por Alan Tygel, a Campanha destacou a contradição da exportação dos agrotóxicos, evidenciando como essa prática configura um duplo padrão prejudicial à saúde pública e ao meio ambiente nos países importadores. Enquanto a Campanha defendia a necessidade urgente de uma regulação mais rigorosa que impeça a exportação de agrotóxicos banidos, representantes da indústria defendiam a suposta segurança dos produtos que fabricam.
Alan Tygel fez um apelo ao Parlamento da Alemanha para proibir a exportação de agrotóxicos para o Sul Global. Ele explicou que, segundo dados da FAO, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, e que, em 2022, foram consumidas 800 mil toneladas de princípios ativos de agrotóxicos no Brasil. “O que também cresce ano após ano são os registros de intoxicações agudas. Em 2019, o Ministério da Saúde registrou 8.412 casos de intoxicação por agrotóxicos. Entre 2010 e 2021, houve 9.806 registros de intoxicações em crianças de 0 a 14 anos, das quais 91 morreram”, apontou Tygel.
O toxicologista Peter Clausing, da Pesticide Action Network Alemanha, explicou que os 52 princípios ativos atualmente não aprovados pela União Europeia são todos classificados como cancerígenos, mutagénicos ou tóxicos para a reprodução. “Nos países do sul, as intoxicações agudas por agrotóxicos são comuns entre os trabalhadores agrícolas. Um estudo realizado pela FAO no Vietnã e no Camboja mostrou taxas de envenenamento superiores a 50 por cento, e outro estudo financiado pelo fabricante de agrotóxicos Syngenta em 24 países concluiu que a taxa era superior a 25 por cento”.
“É uma grande contradição que ingredientes ativos proibidos na UE para proteger o ambiente e a saúde continuem a ser comercializados onde uma maior exposição a agrotóxicos é a norma para uma grande parte da população”, afirmou Clausing. Ele declarou que uma proibição de exportação alemã seria um primeiro passo importante no caminho para uma proibição global de agrotóxicos altamente perigosos.
Agricultura químico-dependente
O representante da Campanha Contra os Agrotóxicos explicou que “infelizmente”, o Brasil vem apostando, nas últimas décadas, em um modelo de agricultura que combina o latifúndio, a monocultura e a produção de commodities para exportação. “Este modelo é intrinsecamente químico-dependente e condena o Brasil a estar hoje, assim como há 500 anos, na posição de colônia. Enquanto os países do Norte Global produzem tecnologia e sustentam seu modo de vida com base nas commodities brasileiras, nós — os países do Sul Global — compramos agrotóxicos, adoecemos nossa população e ficamos com as migalhas”, disse.
Neste sentido, ele enfatizou que é inaceitável a política da União Europeia de proteger seus cidadãos banindo agrotóxicos perigosos para a saúde e para o meio ambiente, mas permitindo que suas empresas sigam lucrando com a venda dessas mesmas substâncias para o Sul Global. “Além de claramente imoral, essa política está baseada em alguns falsos argumentos, como o discurso de que o Brasil, por exemplo, pratica “agricultura tropical” e, portanto, precisaria de agrotóxicos que não são necessários na União Europeia”. Na verdade, trata-se de produtos que foram usados pela UE no passado, e hoje são considerados perigosos demais.
Outra falácia é o impacto da restrição dos agrotóxicos na segurança alimentar brasileira. A indústria frequentemente afirma que o banimento dos agrotóxicos levaria à redução da produção agrícola, afetando a segurança alimentar. Porém, Tygel contestou, afirmando que a fome no Brasil não está ligada à escassez de produção, mas a questões políticas e de distribuição de renda.
Ele destacou ainda a influência que as empresas de agrotóxicos exercem sobre as regulações brasileiras. “As empresas afirmam respeitar as leis locais, mas não mencionam que elas mesmas influenciam essa legislação. Nos últimos dois anos, empresas de agrotóxicos realizaram mais de 700 reuniões com o Ministério da Agricultura no Brasil”.
Por fim, Alan Tygel fez um apelo aos deputados alemães: “Vocês têm hoje a oportunidade de optar por um modelo de cooperação internacional saudável e ético rumo a um futuro viável no planeta Terra, ou seguir com sua política colonial e imoral de lucrar vendendo para nós o que já não serve para vocês”, concluiu.
*Com informações do https://www.bundestag.de/