Organizações promovem curso para capacitação de médicos e médicas na vigilância e combate a agrotóxicos

Por Roberta Quintino l Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.

Foto: André Gouveia.

Entre os dias 2 e 5 de maio, ocorreu no Rio de Janeiro a segunda etapa do curso “Saúde e Agrotóxicos para o Fortalecimento do SUS no Campo”, que reuniu médicos e médicas de diversos estados brasileiros. A formação teve como objetivo abordar os impactos dos agrotóxicos na saúde humana, discutir estratégias de vigilância popular em saúde e combater a subnotificação de intoxicações por agrotóxicos.

Durante o evento, os profissionais debateram ainda sobre o monitoramento de populações expostas a agrotóxicos, os efeitos das substâncias na saúde, tratamentos e linhas de cuidado. Também foi realizada uma análise de conjuntura nacional e internacional, com destaque à aprovação do Pacote do Veneno e seus impactos na saúde e na biodiversidade.

Na abertura da atividade, a pesquisadora da Fiocruz, Karen Friedrich, criticou a aprovação do Pacote do Veneno, que, segundo ela, ocorreu apesar das manifestações de diversas organizações que alertaram sobre os riscos associados à nova legislação. Friedrich destacou que a nova lei fragmenta a regulação dos agrotóxicos e elimina a regulamentação de sua propaganda.

Quanto ao dispositivo que trata da transferência de responsabilidade das competências, a pesquisadora ressaltou que o sistema se mantém tripartite, mas que ações, como a recente derrubada de decisão do IBAMA sobre restrição de utilização de agrotóxicos como o tiametoxam, altamente tóxico para as abelhas, já indicam “uma obstrução do papel das agências reguladoras dos ministérios da Saúde e Meio Ambiente, ampliando as funções do MAPA, que passa a coordenar o processo de reavaliação de agrotóxicos”.

O Pacote do Veneno deve voltar à pauta do Congresso Nacional no dia 9 de maio, quando os parlamentares devem apreciar 17 vetos impostos pela presidência da república, a fim de conter retrocessos legislativos fomentados pela bancada ruralista. 

Capacitação

O Brasil se tornou o maior consumidor de agrotóxicos no mundo, consequentemente, os impactos no meio ambiente e na saúde da população têm acompanhado esse ranking nos últimos anos. De acordo com o Sinan/DataSUS, entre 2010 e 2019, houve um aumento de 109% nos registros de intoxicação por agrotóxicos. 

Nesse contexto, Karen Friedrich enfatiza que os “médicos têm um papel importante de publicizar os casos e relatos relacionados aos agrotóxicos a partir das vivências locais”.

Para Mirelle Gonçalves, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, o processo formativo que já está na segunda etapa é de extrema importância para a luta contra os agroquímicos. De acordo com ela, um dos nossos principais gargalos no Brasil em relação aos agrotóxicos é a subnotificação. “Por isso, temos que avançar na formação e capacitação dos profissionais de saúde para lidarem com as problemáticas dos impactos dos agrotóxicos e a vigilância popular das populações expostas”.  

Como parte da programação, os participantes visitaram a Unidade de Produção da Fazenda Pública Joaquín Piñero e a Praça Agroecológica de Araçatiba, na cidade de Maricá-RJ. Foto: André Gouveia.

O coordenador da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, Leandro Araújo, disse que a formação dos médicos além de garantir diagnósticos mais precisos relacionados à exposição a agrotóxicos, amplia a capacidade de atendimento do Sistema Único de Saúde para identificar intoxicações e doenças associadas às substâncias.

Leandro afirmou que a Rede está comprometida com o fortalecimento do SUS, com a “denúncia dos perigos dos agrotóxicos e promover a agroecologia como um horizonte para a saúde do povo brasileiro”.

Devido à gravidade dos problemas de saúde associados ao uso de agrotóxicos, tanto em casos agudos quanto crônicos, o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Hermano Castro, ressaltou a necessidade de continuidade na formação. “Esperamos manter esse programa de capacitação por muitos anos, alcançando várias edições, para fortalecer a luta contra os agrotóxicos em nossos campos, florestas e águas”, concluiu Hermano.

Comida sem veneno

Como parte da programação, os participantes visitaram a Unidade de Produção da Fazenda Pública Joaquín Piñero e a Praça Agroecológica de Araçatiba, na cidade de Maricá-RJ, para conhecer as estratégias de produção e destinação dos alimentos, cultivados sem veneno, para instituições de interesse social, como abrigos, aldeias indígenas e casas de acolhimento. 

O projeto, que tem como objetivo promover a saúde a partir do cultivo e do acesso de comida sem veneno, se alinha aos objetivos do curso que é preservar o direito à vida, aos territórios e corpos saudáveis, fomentando a formação política e técnica para a defesa da saúde como um direito de todos.

O curso é uma iniciativa da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, pela Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares (RNMP), pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

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