Deputados vinculados ao agronegócio oferecem obstáculos para aprovação das medidas legislativas.
A Assembleia Legislativa do Paraná sediou, na manhã desta segunda-feira (22), audiência pública sobre “Deriva dos Agrotóxicos no Estado do Paraná”. Proposta pela Frente Parlamentar de Agroecologia e Economia Solidária e coordenada pelo Deputado Professor Lemos (PT), a atividade evidencia a necessidade de avanço de normas legislativas para redução de agrotóxicos e promoção da agroecologia. O evento reuniu parlamentares, agricultores, especialistas e representantes de órgãos do Estado e da sociedade civil, entre elas a Terra de Direitos. Durante a audiência, foram levantadas preocupações acerca do uso de agrotóxicos no estado e suas consequências para a saúde e o meio ambiente.
Dentre os projetos em tramitação na Assembleia Legislativa, destacam-se dois de autoria do Deputado Lemos: o Projeto de Lei 116/2021, que versa sobre a deriva e regulamentação da aplicação de agrotóxicos, e o Projeto de Lei 288/2022, que busca proibir a aplicação foliar do princípio ativo fipronil no Estado do Paraná. Além desses, o Projeto de Lei 429/2022, do Deputado Goura (PDT), propõe a instituição da Política Estadual de Redução de Agrotóxicos (PERA) e a criação da Comissão Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (CEAPO). Os parlamentares têm enfrentado um cenário difícil para aprovação das medidas.
Embora esses projetos ainda estejam em tramitação, alguns deles enfrentam resistência na Assembleia Legislativa e estão parados na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Tal situação reflete, em parte, a pressão e influência que o agronegócio possui em ambientes de tomada de decisões. O estado do Paraná possui uma forte identidade agropecuária, com 78% do território paranaense ocupado por atividades relacionadas à pecuária e agricultura. De acordo com o Ipardes, a quantidade média de agrotóxico consumida no Paraná, em 2015, foi de 8,25 litros ao ano. Isso posiciona o estado entre a marca de segundo e terceiro consumidor do país, atrás apenas de Mato Grosso e em disputa com São Paulo.
Por essa razão, iniciativas como a audiência pública realizada hoje, propostas por deputados preocupados com os impactos dos agrotóxicos e dispostos a discutir incentivos às práticas de agroecologia, são de extrema importância.
Fragilidade nas fiscalizações e dificuldade de denunciar as contaminações
A aplicação de agrotóxicos resulta no fenômeno conhecido como deriva, que ocorre quando partículas são desviadas para áreas além do local de aplicação. Mesmo seguindo todas as condições normativas, como calibração adequada, temperatura e ventos favoráveis, a deriva persiste devido à propagação dos resíduos dos agrotóxicos no tempo e no espaço. Essa constatação foi feita na pesquisa “Agrotóxicos e violações de direitos humanos no Brasil: denúncias, fiscalização e acesso à justiça”, desenvolvida pela Terra de Direitos e pela Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida.
Além disso, a pesquisa identificou a dificuldade enfrentada pelas vítimas de contaminação por agrotóxicos em realizar denúncias, e quando o fazem, muitas vezes são criminalizadas. Dentre as principais dificuldades levantadas pela pesquisa para garantir a responsabilização da contaminação por agrotóxicos destaca-se a omissão e a ausência de fiscalização dos órgãos acionados, dificuldade na produção de provas, falta de atendimento à população local, morosidade do Sistema de Justiça e insuficiência normativa. O estudo aponta que esta realidade é presente em todo o país, incluindo o estado do Paraná.
Para avançarmos no debate sobre o uso de agrotóxicos e desencorajarmos sua utilização, é fundamental pautarmos medidas mínimas, como a criação de um canal de denúncias unificado para casos de contaminação, a revisão das distâncias mínimas para aplicação e a divulgação adequada dos potenciais danos causados. Além disso, é essencial destacarmos a importância da agroecologia e das práticas agrícolas das comunidades tradicionais, que representam uma alternativa ao sistema tóxico dos agrotóxicos, que vem envenenando tanto nossos corpos quanto nossos territórios.
*Giovanna Menezes é assessoria jurídica da Terra de Direitos