Com 35 autores/as, o livro compila pesquisas e posicionamentos de dezenas de organizações brasileiras contrárias ao uso de agrotóxicos.
Por Comunicação da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela vida
Mais de 2 mil agrotóxicos liberados nos últimos quatro anos, escassez de recursos públicos para a saúde, educação, ciência e tecnologia, esvaziamento das políticas públicas para a produção de orgânicos e agroecológicos, desmonte dos órgãos e da legislação ambiental. É neste contexto que a bancada ruralista insiste em aprovar o projeto de lei conhecido como “Pacote do Veneno” (PL n.º 6.229/2002), para flexibilizar ainda mais o marco regulatório de agrotóxicos.
Os contrapontos científicos e técnicos a este projeto ganharam forma nas mais de 300 páginas do “Dossiê contra o Pacote do Veneno e em Defesa da Vida”, lançado nesta terça-feira (6). O lançamento ocorreu no quarto dia da Mobilização Nacional Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, articulação de organizações e parlamentares realizada semanalmente ao longo do último mês, com transmissão pela internet e nas redes sociais.
>> Clique aqui para baixar o dossiê: https://bit.ly/3hjRURJ
>> Assista o lançamento na íntegra: https://www.youtube.com/watch?v=RCvTe01jhnU
Com 35 autores/as, o livro compila pesquisas e posicionamentos de dezenas de organizações brasileiras. Além da denúncia contra o “Pacote do Veneno”, a publicação apresenta a Política Nacional de Redução do Uso de Agrotóxicos (PNARA) (n.º 6.670/20160), que elenca alternativas ao uso dos químicos na produção de alimentos.
“Apontamos os caminhos da agroecologia e reforçamos a necessidade deste movimento que é a única possibilidade de se produzir alimentos saudáveis, respeitando a natureza e os direitos humanos”, enfatizou a biomédica e pesquisadora da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco, Karen Friederich, durante o lançamento do Dossiê.
Fran Paula, integrante da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, frisou o papel do Dossiê no atual contexto de “negacionismo da ciência, de um governo da necropolítica e da mentira”. “É um momento da gente reafirmar o nosso compromisso com a verdade, com a ética e com a vida. É uma rica parceria entre ciência e mobilização social”, afirmou.
A Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida fará a divulgação e mobilização sobre o tema com o lançamento do Dossiê nas grandes regiões do Brasil. O “Pacote do Veneno” está pronto para ser votado pelo plenário da Câmara dos Deputados, no entanto, medidas infralegais têm sido aprovadas para avançar em pontos do PL.
O livro é uma produção da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO); Associação Brasileira de Agroecologia (ABA); e Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, em parceria com a Articulação Nacional de Agroecologia e apoio do Instituto Ibirapitanga e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Conta ainda com prefácio assinado por Leonardo Melgarejo e João Pedro Stedile, e posfácio de Leonardo Boff.
Também participaram do lançamento representantes das organizadoras e apoiadoras do Dossiê, Gulnar Azevedo, presidente da Abrasco; Islândia Bezerra, presidente da ABA; André Desgenszajn, integrante do Instituto Ibirapitanga; e Patrícia Canto, integrante da FIOCRUZ.
O Brasil como “lixeira de produtos tóxicos”
Além de está no topo do ranking e maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, 60% do volume de veneno utilizado no Brasil é de produtos proibidos em outros países. “A maior parte dos produtos liberados nos últimos anos são de produtos proibidos em outros países, ou seja, o Brasil sendo essa lixeira de produtos tóxicos”, alerta Karen Friederich.
Estes números são resultados do atual marco regulatório já insuficiente, no entanto, que pode piorar caso o “Pacote do Veneno” venha a ser aprovado. Entre as propostas está a aprovação de agrotóxicos que causam “riscos aceitáveis” de câncer e outras doenças. “É um dos pontos mais destruidores, porque vão permitir que se estabeleça o que é aceitável de doenças no Brasil, que quantidade de doenças e óbitos vão ser aceitáveis para que se continue nesse desenvolvimento do agronegócio”, explica a pesquisadora da Abrasco.
A aprovação de novos registros atualmente passa pela avaliação conjunta por parte da Anvisa, do Ibama e do Ministério da Agricultura. Se houver restrição por algum desses órgãos, o registro não ocorre. O PL 6.229 propõe a centralização de todas as decisões somente no Ministério.
Somando a isso, o projeto propõe a restrição da reavaliação do registro de agrotóxicos. A medida vai na contramão da prática vigente em outros países, em que as revisões são feitas periodicamente para incorporar novas pesquisas e a observação do uso do agrotóxico em uso. Ainda no esforço de ocultar do nome a toxidade e os impactos para saúde e para o meio ambiente, o PL quer substituir o termo ‘agrotóxicos’ para ‘pesticida’.
“Todas as luzes vermelhas se acenderam”
No posfácio do Dossiê, o teólogo Leonardo Boff trouxe o alerta de que “todas as luzes vermelhas se acenderam” no que diz respeito ao avanço da destruição da natureza. Boff participou do lançamento da publicação, e enfatizou o seu aviso citando uma pesquisa da ONU sobre a sobrecarga da Terra, divulgada em abril de 2020.
“Todos os elementos que estão na dispensa da Terra, que são fundamentais para a sustentação da vida e da biodiversidade, estão diminuindo de uma forma que nos mete medo, a tal ponto que a Terra já não aguenta mais. Por isso ela reage com aquecimento global, com eventos extremos, secas de um lado, grandes inundações do outro, tsunamis, terremotos, vendavais, desequilíbrios climáticos. Tudo isso são lições e reações que a mãe Terra nos dá para nos chamar a atenção”, garante.
Para o teólogo, o avanço do agronegócio sobre a natureza é sinal da desconsideração da pandemia da Covid-19. “Eu creio que esses que defendem o pacote do veneno e que neste governo introduziram tantos agrotóxicos não estão tirando a lição que o coronavírus está dando, porque esse vírus é um contra-ataque na Terra contra a humanidade”.
Diante da política genocida do governo Bolsonaro com a pandemia da Covid-19, e de todos os retrocessos impostos por todas as esferas da gestão, Boff também defendeu as mobilizações pelo impeachment do presidente. “Nós não podemos parar, não podemos desistir, temos que resistir e, mais do que resistir, temos que ir pra cima deles. Temos que lutar para salvar a vida, porque nós não queremos um governo necrófilo e nem um futuro de morte para o nosso país, para o nosso planeta”, enfatizou.