Academia e movimentos sociais juntos para melhorar a qualidade da saúde dos trabalhadores do interior do país. A força dessa ideia ganhou materialidade ontem, 13 de agosto, na primeira audiência pública entre poderes instituídos, trabalhadores e movimentos sociais do município de Lagoa da Confusão, no Tocantins. Cerca de cem pessoas, entre pesquisadores, membros do Ministério Público, trabalhadores agrícolas e do setor do turismo, estudantes e demais funcionários públicos debateram os impactos nocivos do agronegócio à saúde humana e a importância da constituição de um plano participativo para trazer benefícios à saúde dos trabalhadores e do ambiente.
Conhecida por ser a porta de entrada do Parque Nacional do Araguaia e da Ilha do Bananal, Lagoa da Confusão não se destaca apenas pelo ecoturismo e por suas riquezas naturais: o município é também um dos maiores produtores e beneficiadores de grãos do Estado. A produção se concentra em aproximadamente 46 grandes fazendas que atraem mão de obra do Paraguai na época da colheita, fazendo a população local saltar de 10 mil para 18 mil habitantes durante a safra. Condições precárias e análogas ao trabalho escravo já foram identificadas entre os anos de 2007 e 2014. A alta produtividade carrega consigo o largo de uso de agrotóxicos. Nos últimos anos, foram notificadas seguidas intoxicações, além de mortes não identificadas na última colheita.
O Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador do Tocantins (CEREST-TO) realiza, desde 2008, ações de Vigilância em Saúde do Trabalhador (VISAT) em parceira com o Ministério Público do Trabalho. Para ampliar a força das ações, Magna Leite, funcionária da Secretaria de Saúde do Estado de Tocantins, buscou o diálogo com a Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado do Tocantins – FETAET – na constituição de um plano de ação participativo em Vigilância. A análise do cenário local e o processo de consolidação da parceria entre VISAT e trabalhadores serviram também de objeto de estudo da tese de doutorado da servidora, defendida no ano passado na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz). A audiência realizada ontem foi a materialização desse processo.
O encontro contou com a presença de pesquisadores como a Drª Heloisa Ferreira Pacheco, médica, professora da UFRJ nas áreas de toxicologia e desenvolvimento socioambiental ; o Dr. Fernando Carneiro, professor da UNB, coordenador do Grupo Temático de Saúde e Ambiente da Abrasco e do Observatório da Política de Saúde Integral das Populações do Campo, Floresta e Águas – Teia de Saberes e Práticas, e de Maila Karina, representante do Ministério da Saúde, além do Movimento Sem Terra; Conselhos Estadual e Municipal de Saúde de Lagoa da Confusão e Gurupi; Conselho de Assistência Social e Conselho Indigenista; profissionais de saúde e de vigilância ambiental das secretarias do município e do estado; Guarda Ambiental Municipal e representantes da Câmara de Vereadores.
Dos encaminhamentos tirados coletivamente para o cumprimento do Plano Participativo de Vigilância em Saúde do Trabalhador de Lagoa da Confusão ficou-se decidido envolver outros órgãos, como a Universidade Federal do Tocantins, a Agência de Defesa Agropecuária do Estado, o Instituto de Natureza do Tocantins e o Ministério Público Estadual, no monitoramento clínico e ambiental das intoxicações e contaminações, além de implantar o protocolo para a realização de diagnósticos locais para o tratamento de intoxicação por agrotóxicos. Haverá também debates públicos sobre a mudança do modo de produção agrícola, a discussão na Câmara de Vereadores sobre a proibição da pulverização aérea de agrotóxicos e a preparação do controle social local sobre a temática por meio de atividades educativas desenvolvidas pelas escolas municipais.