O PL 6299/2002 “deixa de proteger a população brasileira em detrimento de mais lucro privado”, garante Naiara Bittencourt, advogada da Terra de Direitos e da Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.
Projetaço contra o Pacote do Veneno realizado em 2021 / Foto: @projetemos
Por comunicação da Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida
O presidente da Câmara Federal, Arthur Lira (PP), colocou o pedido de urgência para votação do Pacote do Veneno (PL 6299/2002) na pauta desta quarta-feira (9). Se aprovada a urgência, o PL pode ser votado ainda hoje. Este é o projeto de lei que reúne as demandas da bancada ruralista para flexibilizar ainda mais a legislação de agrotóxicos. Entre as medidas está abrir a porteira para o registro de agrotóxicos cancerígenos.
A gravidade desse PL se amplia diante do cenário de aumento recorde de liberação de agrotóxicos durante o governo Bolsonaro, parte deles extremamente tóxicos e muitos proibidos na União Europeia. Apenas em 2021 foram 641 novos produtos liberados.
Antonia Ivoneide, da coordenação do Setor de Produção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, questiona a falta de diálogo imposta pelo regime de urgência. “Qual a urgência em aprovar veneno, a não ser para favorecer o agronegócio? Isso é muito perigoso pra nós”.
O Pacote do Veneno substitui completamente a legislação de 1989, mas está longe de “modernizar” o marco legal, conforme explica Naiara Bittencourt, advogada da Terra de Direitos e integrante da Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida:
“Este projeto vai na contramão da segurança socioambiental, climática e de proteção à saúde. Flexibiliza e facilita os registros de agrotóxicos mais perigosos; dá mais poder ao órgão agronômico e menos poder aos órgãos de saúde e meio ambiente, deixa lacunas favorecendo a indústria agroquímica e o agronegócio. Ou seja, deixa de proteger a população brasileira em detrimento de mais lucro privado”.
Um dos retrocessos propostos pelo PL é a mudança do termo agrotóxico para “pesticida” e “produtos de controle ambiental”: “Isso é uma camuflagem para facilitar o uso dos agrotóxicos no Brasil”, frisa a liderança do MST.
A mobilização contra o Pacote do Veneno tem chegado a diversos setores da sociedade. O abaixo-assinado “Chega de Agrotóxicos” soma mais de 1,7 milhão de apoios.
Figuras públicas, artistas e influenciadores se somam ao coro pela produção de alimentos sem o uso de venenos. A chef de cozinha Paola Carosella se manifestou em suas redes sociais contra a votação do Pacote, e provocou: “Se você fosse num restaurante e pedisse um prato, e o garçom te perguntasse ‘com ou sem veneno?’. Eu espero que você fale sem veneno. […]”.
Arte Marta Moura @moura_marta_
A tentativa mais recente de colocar a matéria em votação foi no apagar das luzes do ano legislativo de 2021, depois de um pedido de urgência feito por deputados representantes do agronegócio. Pela rápida reação negativa da bancada de oposição e nas redes sociais, o PL saiu da pauta. No entanto, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP), prometeu retomar o tema no retorno das atividades de 2022.
Para a integrante da Campanha Contra os Agrotóxicos, a tentativa de aprovar o Pacote do Veneno em regime de urgência demonstra os vícios formais e materiais deste projeto de lei.
“O conteúdo do PL é inconstitucional e colide com outras legislações brasileiras em diversos temas, além de ser rechaçado por organizações de pesquisa, saúde e socioambientais. Por isso o projeto pode passar sem considerar o debate profundo científico e social e em processo viciado. Se realmente seu conteúdo fosse benéfico à sociedade brasileira, o debate franco, aberto e ponderado seria respeitado pela Câmara dos Deputados”, garante Bittencourt.
Pressão sobre os deputados
A pressão sobre os deputados da bancada ruralista já é uma das iniciativas em curso, com o mote “Se votar, não volta”. Caso o PL entre na pauta da Câmara, a vinculação da figura dos parlamentares ao avanço do uso de agrotóxicos promete se intensificar nas bases eleitorais de cada um.
Como parte da resistência contra o PL, a Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida iniciou a mobilização “Ação Urgente Contra o Pacote do Veneno”, na última quinta-feira (3). A reunião virtual teve representação de todas as regiões do Brasil, com cerca de 70 participantes ligados a movimentos sociais do campo e da cidade, coletivos, entidades e mandatos parlamentares que integram a Campanha.
O encontro teve como foco a apresentação de propostas de ações conjuntas nas redes sociais e presenciais, em todo o Brasil. Tuitaços, pressão popular sobre os deputados da bancada ruralista, ações de rua e inauguração de placas em territórios livres de agrotóxicos estão entre as iniciativas planejadas para os próximos dias.
Política Nacional de Redução de Agrotóxicos
Na contramão do PL do Veneno, centenas de entidades do campo e da cidade, ligadas à produção e à defesa da agroecologia, da saúde pública, da ciência e da natureza defendem a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, a PNaRA (PL nº 6.670/2016).
Entre as medidas propostas pelo PL está a redução gradual do uso de agrotóxicos e o estímulo à transição orgânica e agroecológica; a reavaliação periódica de registro das substâncias (na legislação atual, o registro é eterno); a proibição da aplicação de veneno próximo a áreas de proteção ambiental, de recursos hídricos, de produção orgânica e agroecológica, de moradia e de escolas; e a redução da pulverização aérea.
Inauguração da placa “Aqui não usamos veneno” na lavoura de Alik Wunder, integrante da Aliança em Prol da APA da Pedra Branca, Caldas (MG) / Foto: Arquivo pessoal
A engenheira agrônoma Fran Paula, integrante da Federação de Órgão para Assistência Social e Educacional (FASE) e da Campanha Contra os Agrotóxicos, frisou a necessidade de combinar a resistência contra o Pacote do Veneno com a pressão pela aprovação do PNARA.
“Precisamos reforçar a nossa atuação pela PNARA. A sociedade precisa saber que a gente tem uma proposta concreta para a regulamentação de agrotóxicos no Brasil e contrária ao Pacote do Veneno”, garantiu a agrônoma, lembrando que este PL foi construído a partir da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), há cerca de 10 anos, com ampla participação social.
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Nós agricultores e consumidores, imploramos pela redução da quantidade de produtos tóxicos usado na alimentação no Brasil. Até quem não entende nada sobre veneno percebe que com mais agrotóxicos tem aumentando mais doenças e mortes pre maturas.