Por Pedro Canário l Portal UOL – Publicado em 2 de maio de 2023.
Funcionários da Syngenta, uma multinacional de defensivos agrícolas, combinaram, em bilhetes, como esconder um insumo altamente poluente antes de uma vistoria de fiscais do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
O caso está na origem de uma multa de R$ 1,3 bilhão aplicada à companhia, anulada recentemente por uma juíza de São Paulo. Segundo o órgão ambiental, a empresa acrescentou um bactericida a três de seus produtos em quantidades três vezes superiores ao autorizado pelo órgão ambiental, pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e pelo Ministério da Agricultura.
Durante uma das visitas à unidade, no dia 8 de novembro de 2021, os agentes do Ibama encontraram um bilhete com orientações para a “passagem de turno Fifor [nome interno da fábrica de Paulínia]”: “Às 11:00 da manhã o Marcelo nos informou que era para retirar todo o material de Engeo Pleno [um dos produtos], pois estamos em fiscalização na planta”.
Continuava o bilhete: “Foi retirado todo o material da Fifor 1 por conta da visita. O material está na rua 15, no Loguim [nome do depósito de insumos]. É só falar com o líder lá que ele está sabendo. Todo o material que está lá vai voltar para a Fifor para dar sequência na formulação de Engeo Pleno. O caderno de adição de bromo e os cadernos de tratamento de Engeo e Karate [nome dos outros dois produtos] estão com a Fernanda. A mesma pegou enquanto a visita estava em nossa área”.
No dia seguinte, outro bilhete: “Às 08:00 recebemos a informação que a fiscalização estava novamente no site. Com isso, devolvemos os materiais para o Loguim e o bromo ficou com o Daniel no pátio. 11:00 foi nos passada a informação que era para voltar com as matérias primas para a área e seguir normalmente (folhas de controle estão na gaveta da Fernanda)”.
O QUE A SYNGENTA ESTAVA ESCONDENDO
Em novembro de 2021, o Ibama encontrou, em inspeção na fábrica da Syngenta em Paulínia (SP), evidências de que a empresa havia adicionado bronopol, também tratado como bromo, a três de seus produtos e havia escondido a informação dos órgãos de controle. Os bilhetes foram descobertos nesta vistoria.
O Ibama alega que, conforme a Echa (Agência Europeia das Substâncias Químicas), o bronopol é “muito tóxico para a vida aquática; perigoso se engolido; perigoso em contato com a pele; causa sérios danos oculares; causa irritação de pele; e pode causar irritação respiratória”.
Portanto, continua a autarquia, as informações sobre os problemas do bactericida já eram conhecidas.
A empresa não negou – e até fez acordo com o Ibama para pagar R$ 4,5 milhões e encerrar o processo administrativo. Entretanto, no processo judicial, a Syngenta alegou que o produto não causa “nenhum malefício ao meio ambiente ou à saúde humana”.
Na época, conforme o próprio Ibama admite, o bromo era tratado como Classe III pela Anvisa, ou seja, “componente de preocupação toxicológica e/ou ambiental não determinada”.