Organizações e movimentos denunciam o desmonte da Lei Zé Maria do Tomé com a liberação da pulverização aérea com drones no Ceará

Da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida

Desde a última sexta-feira (6), organizações, movimentos sociais e parlamentares têm denunciado por meio de notas públicas a possível liberação de pulverização aérea por drones no estado do Ceará. Esse posicionamento é resultado do anúncio do governador Elmano de Freitas (PT) sobre a aprovação de uma Norma que permite o uso de drones para a pulverização de agrotóxicos.

A alteração se dará por meio de três projetos de lei (609/2023, 1075/2023 e 819/2024) que já foram aprovados na Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Assembleia Legislativa do Ceará (ALCE).

O Ceará é atualmente o único estado brasileiro que proíbe a pulverização aérea, resultado da luta dos movimentos sociais. O autor da lei Zé Maria do Tomé, deputado estadual Renato Roseno (PSOL), se posicionou denunciando o alarmante crescimento de contaminações por agrotóxicos pelo relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que saltou de 19 casos em 2023 para 182 em 2024 (crescimento de mais de 950%). Além do uso dos agrotóxicos como armas químicas em conflitos fundiários, afetando populações vulneráveis, incluindo crianças e indígenas.

Entre os movimentos, o MST prontamente divulgou uma nota afirmando que “essa medida representa um grave retrocesso nas políticas de proteção ao meio ambiente e à saúde pública. Pois, aumenta os riscos de contaminação do solo, das águas e da biodiversidade, além de comprometer a saúde das pessoas, expondo trabalhadores e comunidades ao uso indiscriminado de agrotóxicos. Essa prática também causa conflitos nos territórios, incluindo o assassinato de trabalhadores.”

Já o Fórum Cearense pela Vida no Semiárido e a Articulação Cearense de Agroecologia, criticou a agilidade do governo do estado ao aprovar políticas que promovem retrocessos no que refere aos direitos humanos dos povos do campo, principalmente, enquanto outras pautas que promovam avanços têm sido negligenciadas. 

“Enquanto se nota a agilidade para a tentativa de aprovação de propostas como essa, segue paralisada a iniciativa de aprovação de uma Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica no Ceará, que vem sendo pautada por agricultores (as) familiares e pelas mais diversas organizações sociais em nosso estado.”

A luta contra os agrotóxicos envolve diversos segmentos sociais e políticos. O estado do Ceará tornou-se símbolo dessa luta ao aprovar, em 2019, a Lei Zé Maria do Tomé, referência nacional e internacional em proteção da saúde e do meio ambiente, e que foi validada em todas as instâncias judiciais, especialmente no Supremo Tribunal Federal, por unanimidade dos Ministros. 

Modelo de drone agrícola a ser usado nesse tipo de iniciativa.

Na esteira do debate ambiental e de pensar uma governança que atende o direito à vida e não o interesse do lucro, a Campanha da Fraternidade Ceará, após um Seminário Regional de Formação com representantes de 9 arquidioceses, compartilhou reflexões sobre o papel dos poderes públicos, a Igreja e a sociedade cearenses. 

“Dirigimo-nos ao governo do estado e dos municípios, à Igreja e a toda a sociedade para anunciar a importância de assumirmos a Ecologia Integral como princípio evangélico e ético norteador de nossas atitudes. Estamos no decênio decisivo para o planeta! Ou mudamos e convertemos-nos, ou provocaremos com nossas atitudes individuais e coletivas um colapso planetário. O tempo é agora!” 

Em nota, a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) lembra que a redução de riscos por pulverização com drone é uma falácia, considerando sobretudo, que são equipamentos com difícil controle e monitoramento. “A argumentação de que os drones reduzirão os riscos é falaciosa, até porque seu controle será impossível devido às características daquele equipamento. De baixo custo, terá seu número multiplicado a dimensões simplesmente impossíveis de serem acompanhadas pelos sistemas de fiscalização.”

Também no sentido de aliar o debate das mudanças climáticas ao agronegócio, em nota, a FETRAECE salientou que “o Projeto fomentado pelo Governador vai na contramão do debate sobre as mudanças climáticas e da construção de um modelo de agricultura sustentável baseado na agroecologia, produzindo alimentos saudáveis e de qualidade preservando a saúde pública e o meio ambiente.”

Esse cenário de retrocessos na luta contra os agrotóxicos nos estados é resultado da aprovação de leis no âmbito nacional que abriram mais precedentes para que iniciativas como essas avancem. Embora, não seja a primeira vez que esse tipo de projeto é colocado na Alece. Em março deste ano, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, se manifestou em nota diante de duas iniciativas legislativas que visavam permitir a pulverização aérea de agrotóxicos através de veículos aéreos não-tripulados, conhecidos como drones.

É uma disputa desigual e cobrar para que o governo do Ceará reconsidere essa proposta e priorize políticas que garantam a soberania alimentar é um exercício que todos e todas devem fazer. Nesse sentido, diversos parlamentares que já atuam em defesa da pauta dentro da Alece também se manifestaram por meio de suas redes sociais. 

A deputada estadual Larissa Gaspar (PT), afirmou ser “inoportuna qualquer iniciativa que flexibilize a proibição em questão, o País precisa avançar no combate ao uso indiscriminado e nocivo de agrotóxicos.” Já o deputado Missias Dias (PT) ressaltou o compromisso do mandato “na luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos que contaminam os alimentos, o solo e a água.”

“Não podemos tolerar um retorno à lógica que prioriza o lucro do agronegócio em detrimento da saúde e vida da população. É inadmissível que o governador, coautor da lei e militante forjado nas lutas do campo, se alinhe a interesses que ameaçam a vida dos cearenses.”

Todos os posicionamentos criticam duramente a postura do governador Elmano Freitas, considerando seu histórico de luta junto ao povo, e vê com indignação essa posição desses representantes em defesa dos interesses econômicos que se dispõem a atuar como inimigos da população. 

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