Por Paula Schitine e Lanna Paula Ramos l Ong Fase e Terra de Direitos.
O Curso de Formação em Agrotóxicos, Saúde e Agroecologia foi promovido pela Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida em parceria com a FASE e Terra de Direitos, junto com os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Santarém e de Mojuí dos Campos (STTR), Cáritas, Instituto de Saúde Coletiva/UFOPA e Núcleo de Agroecologia e Bem Viver na Amazônia/UFOPA, Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), e Associação de Moradores do Bairro Pérola do Maicá/AMBAPE e Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ).
O objetivo principal do encontro, realizado de 06 a 08 de novembro, na sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Mojuí dos Campos, foi levar aos sujeitos dos territórios do Baixo Amazonas, BR-163, Região metropolitana de Santarém, Nordeste e Sudoeste Paraense a denúncia contra os agrotóxicos e seus graves impactos à saúde e ao meio ambiente, e também anunciar a agroecologia como solução para a construção de territórios livres e saudáveis.
Além disso, o curso visa ampliar a compreensão sobre os fundamentos históricos, políticos e econômicos que explicam o uso de agrotóxicos no Brasil; e na região amazônica; formar multiplicadores de conhecimento e articuladores em seus territórios de origem, em uma perspectiva crítica e emancipatória; discutir a atualidade da dinâmica política e econômica do agronegócio e debater a importância das estratégias de controle social, a exemplo da Campanha, enquanto ferramentas de mobilização e comunicação na disputa da hegemonia dos discursos relacionados à temática.
No primeiro dia, foi realizada uma apresentação da metodologia da cartografia social a ser utilizada para registro das denúncias de casos de intoxicação e contaminação de agrotóxicos nos territórios dos participantes. Este momento foi facilitado pelo ENCONTTRA (Coletivo de Estudos Sobre Conflitos pelo território e pela Terra). Na parte da tarde, o educador da FASE Amazônia, Guilherme Carvalho, fez uma análise de conjuntura.
A educadora da FASE Mato Grosso e integrante da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Fran Paula, uma das autoras do estudo “Agrotóxicos no Pantanal”, expôs casos de contaminação e as estratégias comunitárias usadas para registrar as intoxicações e contaminações e denunciar aos órgãos competentes.
O advogado popular, Thales Zendron Miola, que faz parte do coletivo jurídico da Campanha, mostrou os passos necessários para se fazer uma denúncia de contaminação por agrotóxicos e apresentou materiais da Campanha, como o site e a publicação “Agrotóxico e violações de Direitos Humanos no Brasil”, elaborada pela Campanha e o Terra de Direitos.
“O Curso de Formação em Agrotóxicos, Saúde e Agroecologia tem a importância de contribuir na formação de atores locais de diversos segmentos do estado do Pará ligados aos movimentos sociais, sindicatos e povos dos campos, das águas e floresta para atuação como multiplicadores e multiplicadoras de conhecimentos sobre a temática dos agrotóxicos e saúde, ou seja, é um processo que vai além da formação política, mas que busca constituir um espaço de convergência e articulação em rede a partir da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida”, avalia o educador da FASE Amazônia, Samis Vieira. “Outro ponto positivo são as atividades nas comunidades, que permitem às lideranças desenvolver ações voltadas ao trabalho de base em forma de ação nas comunidades junto às famílias e coletivos, criando um espaço rico de troca de saberes e construção de estratégias de combate aos agrotóxicos nos territórios”, completa.
Este momento de formação também auxilia na compreensão da questão dos agrotóxicos no país, desde a sua origem, as pautas em disputa, os impactos na saúde e meio ambiente e como podemos avançar na construção da unidade e articulação em rede a partir da Campanha Contra os Agrotóxicos.
Intoxicação nos territórios
Um dos palestrantes do curso, o médico Marcos Mota, do Instituto Evandro Chagas, diz que é grave o nível de contaminação por agrotóxicos em pessoas na região. “O que precisamos e chamamos a atenção é que tanto Mojuí dos Campos e Belterra são populações que estão expostas a esses venenos, e são as que mais recebemos ocorrências. E isso é um grande problema de saúde pública”, denuncia.
Durante a palestra, o médico mostrou que tipos de produtos são os mais perigosos para a saúde, como os herbicidas com o glifosato, proibidos em diversas partes do mundo. “O motivo da proibição é pelo impacto que ele causa na saúde humana, eles produzem alterações nos rins, no fígado, no sistema que produz células para o sangue – hematopoiese, e ocasionando também alguns adoecimentos que são extremamente difíceis de identificar e de associar, como alterações hormonais, os desreguladores endócrinos”, exemplifica o médico. “E um dos mais preocupantes é o efeito cancerígeno, ou seja, o efeito gerador de câncer, e já foi comprovado com esses produtos em laboratórios”, completa.
Sileuza Barreto Nascimento, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mojuí dos Campos, conta que os impactos dos agrotóxicos são muitos, na saúde das pessoas, e também na questão econômica, porque são famílias que acabam vendendo as suas terras e assim acaba acontecendo o êxodo rural. “As famílias que não abandonaram suas terras, são afetadas diretamente com o uso em grande escala dos agrotóxicos aqui na região. E também tem a questão dos nossos ambientes, dos nossos igarapés, que hoje infelizmente muitas famílias que usavam os igarapés para todo consumo e também para questão de irrigação de suas plantações, elas não conseguem mais usar por conta de todos eles estarem contaminados com agrotóxicos”, relata.
Valdeci de Oliveira, moradora do bairro de Pérola do Maicá, região oeste de Santarém, traz a perspectiva de que os agrotóxicos deveriam ser tratados mesmo como venenos, devido ao alto teor tóxico e de contaminação. E ela considera fundamental a resistência nos territórios, tanto urbanos, quanto periurbanos e rurais.
“No cenário que está posto aqui, e de forma geral, a gente percebe isso Brasil afora, as populações e as organizações sociais elas vêm tentando travar uma luta de resistência para minimamente diminuir o que está acontecendo”, avalia. “Eu acredito que a união dessas organizações é que faz a gente ter de fato um resultado mais proveitoso diante do grande capital, desde que nós de fato saibamos identificar esses atores e daí traçar estratégias que vão de encontro com essas problemáticas que estamos vivendo”, completa.
“Nesta atual conjuntura do avanço do agronegócio na região amazônica, principalmente das plantações de soja próximas a territórios indígenas e da agricultura tradicional, a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida recebeu neste último período várias denúncias de violações de direitos humanos referente ao uso de agrotóxicos, desde pulverização aérea e drone em escolas a relatos de intoxicação. Devido a esta situação de calamidade e saúde pública, é fundamental esta organização de processos formativos na região, que não só tragam informações sobre os malefícios dos agrotóxicos à saúde e meio ambiente, mas também potencializam a organização em rede para a luta pela vida contra este modelo da morte”, justifica Mirelle Gonçalves, da coordenação da Campanha.