Vitória da mobilização popular!

Em meio a tantos enfrentamentos e perdas no contexto sanitário, ambiental, social, econômico e político, podemos comemorar um retrocesso a menos em relação aos agrotóxicos: depois de muita disputa e intensa mobilização popular, foi mantido o banimento do  ingrediente ativo Paraquate no Brasil para o dia 22 de setembro!

Diante da possibilidade de ampliação do prazo para a proibição do Paraquat pela Anvisa, a Campanha Contra os Agrotóxicos cumpriu seu papel de articular Ciência e sociedade civil, promovendo debate e mobilização em defesa da vida. Sabemos que são interesses econômicos que sustentaram toda a tentativa de manter a circulação do Paraquate, mas do ponto de vista da vigilância sanitária e da proteção à saúde das pessoas, temas que competem à Anvisa, não há novas evidências que pudessem levar a mudança de posição, uma vez que não são encontrados na literatura científica estudos que alterem os achados que apontam a toxicidade do Paraquate, em especial os efeitos mutagênicos e a relação com a doença de Parkinson.

Ainda manteremos toda a articulação construída para acompanhar o cumprimento das normativas, porque o que nos move não é uma militância ingênua e sim uma intransigente defesa da vida e de um modo de produzir saudável e sustentável!

Idas e vindas da discussão sobre o Paraquat

Em mais de 50 países o Paraquate já foi banido, incluindo China e União Europeia, de onde o Brasil mais importa este produto. O agrotóxico foi proibido nestes países após evidências científicas demonstrarem os riscos à saúde, assim como também pode concluir a Anvisa no processo de revisão do Paraquate no Brasil, iniciado em 2008 e só finalizado em 2016.

Considerando os riscos à saúde, em 2017 a Anvisa havia definido, por meio da Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 177, que o Paraquate seria proibido no país a partir de 22 de setembro de 2020. O veneno é preocupante sobretudo pela sua letalidade, por provocar intoxicação aguda mesmo em baixas doses, pela ausência de um antídoto em caso de intoxicação, por causar mutações genéticas e agir no sistema nervoso, estando relacionado com a doença de Parkinson, por exemplo.  

Mesmo com a notória subnotificação de intoxicação por agrotóxicos, dados do Ministério da Saúde/SINAN mostram que entre 2010 e 2019 foram mais de 45 mil notificações de exposição à agrotóxicos de uso agrícola, sendo que menos de 44% possuíam informação de qual era o ingrediente ativo, e o Paraquat foi a 3ª substância mais encontrada nos dados. Foram 530 pessoas intoxicadas pelo Paraquate, das quais 138 morreram e 129 delas por suicídio. Portanto, é uma substância de relevante interesse de saúde pública, e o que se espera do Estado é a adoção das melhores medidas protetivas para a população.  

Mesmo com todas as evidências científicas, em março de 2020, a Anvisa voltou a discutir o prazo para a total proibição do Paraquat estabelecido na RDC  177/2017, após pedido da Frente Parlamentar da Agropecuária e de produtores de soja e de agrotóxicos, sob alegação de que os impactos econômicos seriam enormes para o setor e que aguardavam dados de pesquisa encomendada. Uma liminar da 1ª Vara Federal de Dourados (MS) impediu que fossem feitas alterações e, em julho, após recorrer da decisão, a Anvisa não teve mais o impedimento de alterar o prazo previsto para proibição do Paraquat, vindo a ser pautado o assunto na reunião da Diretoria Colegiada – DICOL do dia 18/08.

Na ocasião, o parecer do diretor relator foi contrário ao adiamento do prazo, pois considerou ausente de motivos e razões que pudessem levar a Agência a alterar seu marco regulatório definido anteriormente. Uma das diretoras pediu vistas e somente em 15/09 o tema voltou para a pauta, sendo que esta mesma diretora sugeriu minuta de proposta de alteração dos prazos para que houvesse tempo de apresentação de novos dados e considerando também o impacto econômico da retirada do produto do mercado. Apenas o diretor presidente acompanhou esta proposta e os demais acompanharam o parecer contrário do diretor relator, assim, por 3 votos a 2, foi mantido o prazo de banimento do Paraquate para 22 de setembro de 2020. 

É importante destacar que a pesquisa brasileira financiada pela Força-Tarefa-Paraquate, usada intensamente como argumento para adiamento do prazo, foi reprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, do Conselho Nacional de Saúde. Posteriormente, foi apresentada ao Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp e, na sequência, suspensa, segundo nota divulgada pela Universidade, por haver indícios de omissão de informações e denúncias de conflitos de interesse.

Outro questionamento relevante, e que também fizemos à Anvisa, é que, mesmo que o pedido de adiamento do prazo se sustentasse pela espera de resultados de novos estudos, que tipo de desenho experimental estas pesquisas encomendados pelas empresas poderiam ter para desacreditar todos os demais estudos internacionais que já demonstram a toxicidade do Paraquate? 

Por isso, celebramos que a intensa pressão popular tenha relembrado a Anvisa do que a própria Agência já tinha concluído em 2015: “de posse dos dados atualmente disponíveis, ainda que com tamanhos impactos agronômicos, econômicos e ambientais conhecidos, não há respaldo legal para a manutenção da utilização de produtos à base de Paraquate no país”. Que sigamos resistentes e vigilantes na luta pela vida!

Um comentário

  1. Enquanto a agricultura estiver nas mãos dos grandes agricultores, os da ala do agronegócio, a luta será sempre árdua em banir esses venenos que não trazem nenhum benefício para a nossa saúde. O que o governo tem dar maior atenção é para os produtores da agricultura familiar que é saudável e respeitam a terra e principalmente, a saúde de todos. Parabéns por essa conquista e que continuem nessa luta de Titãs.

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