Como a agroecologia e a luta contra os agrotóxicos contribuem para a superação das desigualdades sociais no Brasil?

Por Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.

Às mulheres negras que há séculos nos ensinam a semear resistência.

São diversas as razões que nos levam a lutar contra os agrotóxicos e pela agroecologia no Brasil, acreditamos que a defesa de sistemas alimentares saudáveis são fundamentais para a promoção da justiça social,  da proteção do meio ambiente e da garantia de saúde para a população.

Principalmente se considerarmos o modelo de desenvolvimento agrícola hegemônico no país,  concentrador  de terras e promotor de desigualdades, que produz  commodities e não alimento. Esse modelo agroexportador viola direitos fundamentais, e produz diversos impactos na saúde e no meio ambiente. É insustentável, e quimicamente dependente, onde o lucro está acima da vida. 

Ao defendermos a reforma agrária, a agricultura familiar camponesa, dos povos e comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas, estamos reafirmando que agricultura queremos para o Brasil, outro modelo agroalimentar agroecológico e comprometido com o enfrentamento às desigualdades sociais históricas como o não acesso à terra, território e alimento.

Tais desigualdades atravessam a produção e consumo de alimentos, e são vivenciadas há muito tempo por mais da metade da população. Uma das pioneiras na denúncia desta violação foi Carolina Maria de Jesus, mulher negra e favelada, mãe e catadora de lixo, viu a fome e a descreveu em suas produções escritas na década de 50. 

Carolina escrevia em seu diário a sua condição de fome e a dos moradores da favela do Canindé em São Paulo, a difícil jornada que travava diariamente com seus filhos, sem direito à moradia e dignidade, escrevia sobre a realidade do Brasil. 

30 de maio de 1958 … “Troquei a Vera e saímos. Ia pensando:  será que Deus vai ter pena de mim? Será que eu arranjo dinheiro hoje? Será que Deus sabe que existe as favelas e que os favelados passam fome?”

… O José Carlos chegou com uma sacola de biscoitos que catou no lixo, quando eu vejo eles comendo as coisas do lixo penso: E se tiver veneno? É que as crianças não suportam a fome (Carolina Maria de Jesus 1960).

Em seu livro Quarto de Despejo: Diário de uma favelada publicado em 1960, Carolina de Jesus dissecou o racismo no Brasil e a injustiça alimentar, relacionava a fome e a pobreza com as desigualdades sociais promovidas pelo Estado, a fome nunca foi por ela naturalizada, e não deveria ser por ninguém. 

“Quando estou na cidade tenho a impressão de está na sala de visita com seus lustres de cristais, seus tapetes de veludo, almofadas de cetim. E quando estou na favela tenho a impressão que sou um objeto fora de uso digno de estar num quarto de despejo” (JESUS, 1960)

As obras de Carolina se tornaram atemporais, considerando a manutenção da fome na atualidade brasileira o aumento da desigualdade social. Onde só 4  entre 10 famílias conseguem acesso pleno à alimentação no Brasil. 

Conforme a rede de pesquisa sobre soberania e segurança alimentar – Rede Penssan, no ano de 2022 cerca de 125,2 milhões de brasileiros passaram por algum grau de insegurança alimentar. Insegurança alimentar é a condição de não ter acesso pleno e permanente a alimentos. A fome representa sua forma mais grave. 

Tal como Carolina Maria de Jesus não devemos naturalizar a fome, o racismo e as demais desigualdades sociais que permanecem causando adoecimento e morte de muitos brasileiros e brasileiras. 

E por entendermos que o modelo capitalista que explora e contamina a terra, a água e o ar com agrotóxicos e transgênicos, é o mesmo modelo que  explora e adoece corpos nesta sociedade, se alimenta do racismo e das desigualdades sociais. 

Portanto, a luta contra os agrotóxicos é também uma luta por justiça social. 

Não se trata meramente da substituição de insumos agrícolas, e sim a busca de transformações estruturais no modelo de desenvolvimento no país. Onde a agroecologia e a reforma agrária popular contribuam para uma sociedade mais justa, e o alimento possa ser um direito garantido a todos e todas.

Acesse aqui o caderno Carolina Maria de Jesus.

Bitita – Composições de Carolina Maria de Jesus.

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