Com Lira e Pacheco no Congresso, bancada ruralista busca avanço de pautas impopulares

Por Cristiane Sampaio
Do Brasil de Fato

Com a chegada de Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) às presidências da Câmara dos Deputados e do Senado, a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), que congrega setores do agronegócio, pode encontrar, no biênio 2021-2022, um terreno político mais fértil para dar passagem às pautas de interesse do segmento. Ambos integrantes da bancada ruralista, nome popular da FPA, os mandatários são vistos como um elo importante entre o Legislativo e governo Bolsonaro, que tem o grupo como um dos seus principais braços políticos desde o início da gestão.

“Trata-se de uma elite parlamentar que dá sustentação a diferentes áreas do governo, e agora há um fortalecimento e um reconhecimento dessa bancada, que pode contar com uma linha de facilitação dos diálogos”, afirma a cientista política Mayrá Lima, que desenvolve estudos sobre a FPA no âmbito do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol/UnB).

A observação da pesquisadora se coaduna com as manifestações mais recentes do grupo. Ao assumir o cargo de novo presidente da FPA, na última terça-feira (2), o deputado Sérgio Souza (MDB-PR) disse que a bancada vive seu “melhor momento” para tirar da gaveta pautas ainda não emplacadas no Legislativo.

 “Há uma convergência que nenhum outro presidente da FPA teve nas gestões passadas. Estamos passando pelo melhor momento da convergência, da vontade e da possibilidade”, disse, em um discurso acompanhado presencialmente por atores como a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, ex-presidenta da FPA e um dos nomes fortes do agronegócio.

Ao falar em momento “promissor”, o parlamentar fez menção ainda à “unicidade” e ao alinhamento com o “pensamento ideológico” do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Aproveitou também para anunciar a agenda tida como prioritária pela FPA para esta nova fase, que deverá contemplar regularização fundiária, revisão das normas que tratam de demarcação de territórios indígenas e ainda liberação de novos agrotóxicos.

“Vai dobrar o nosso trabalho, que agora deve ser mais firme, mais forte do que nunca na resistência, na denuncia e na firmeza, porque, lamentavelmente, no Congresso – e na Câmara, principalmente –, foi eleita uma maioria que é conservadora e ligada a essa área”, comenta o deputado João Daniel (PT-SE), coordenador do núcleo agrário da bancada do PT, ao lembrar que a frente reúne cerca de 260 parlamentares.  

No caso da pauta dos agrotóxicos, por exemplo, a gestão Bolsonaro tem batido recordes sequenciais. Em 2020, foram autorizados 493 novos registros de pesticidas, 19 a mais do que no ano anterior. O levantamento é dos portais Repórter Brasil e Agência Pública, que localizaram quase 1 mil liberações de venenos nos dois primeiros anos de mandato do presidente.  

Balizas

O aval, no entanto, não passou imune a críticas, tendo sido sempre acompanhado por um forte coro popular e de especialistas duramente contrários à liberação. Para Mayrá Lima, essa e as demais pautas apresentadas pela FPA para este período tendem a ter trajeto e velocidade novamente balizados pelos movimentos do campo da oposição.

“Tem que se considerar a oposição organizada, porque há movimentos sociais de luta por terra e territórios que são organizados, e esse tipo de pressão pode influenciar, sim, os dois presidentes das duas casas. Apesar da ligação deles com a FPA, o cargo deles exige e é passível de pressão de ambos os lados”, pontua, ao lembrar a já conhecida impopularidade de parte da agenda ruralista.

Medidas como a retirada de direitos da população indígena, a facilitação do uso de pesticidas e as iniciativas que comprometem o bioma amazônico, por exemplo, costumam atrair críticas de setores da classe média, artistas, internautas e outros grupos. A mobilização é conhecida por atrasar os planos políticos da FPA no Congresso.

“A gente já previa que neste ano, o terceiro ano de mandato [dos parlamentares e do Bolsonaro], eles fossem retomar a pauta do ‘Pacote do Veneno’ ou de elementos que estão contidos ali. A gente também já está articulado pra [lidar com] isso”, antecipa, por exemplo, a militante Juliana Acosta, da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida.

Ela comenta que os articuladores populares não esperam “um ambiente favorável ao diálogo”, mas buscam turbinar as próprias ferramentas políticas para oxigenar a luta contrária às demandas da FPA. O caminho, na visão do grupo, passa pela disseminação de informações para o grande público. A reedição de um dossiê científico publicado em 2018 a respeito dos riscos dos agrotóxicos é o principal destaque mencionado pela militante.  

“Este ano a campanha completa dez anos e, por mais que o cenário na tomada de decisões venha piorando junto com o aumento do uso de venenos e as intoxicações, seguiremos cumprindo nosso papel de levar informação pra sociedade e defender a saúde e a vida. Resistiremos com nossas melhores armas, a mobilização popular e o conhecimento científico.”

Edição: Rodrigo Chagas

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