Em ação inédita, entidades contestam no STF a liberação de agrotóxicos pelo governo do RS

No dia 08 de março, dia Internacional da luta das Mulheres, três Conselhos Estaduais de Direitos e três entidades da sociedade civil ingressaram com a peça Amicus Curiae no Supremo Tribunal Federal (STF), colaborando na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6955), da lei estadual nº 15.671/2021, que libera agrotóxicos proibidos nos seus países de origem no Rio Grande do Sul.

As entidades, Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH-RS), Conselho Estadual de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul (CES-RS), Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (CONSEA-RS), Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), União Gaúcha em Defesa da Previdência Social e Pública e Terra de Direito alertam para os graves retrocessos no âmbito jurídico, social, ambiental, na saúde e alimentação do povo gaúcho. A peça jurídica aponta para a liberação de mais 37 tipos de venenos no Rio Grande do Sul.

AtrazinaFipronilPiroxasulfonaCarbendazim
Florpirauxifen BenzilSaflufenacilCarbosulfanoFluopiram
SimazinaCianamidaHalauxifeno MetílicoSulfoxaflor
CiclaniliproleIndaziflamTebufenozideCloretos de Etilbenzalconio e Benzalconio
MetaflumizoneTepraloxidimDiafentiuromMetidationa
Tiencarbazona-metílicaDicloranaMetoxifenozidaTifluzamida
DietholateNovaluromTiodicarbeDinotefuram
Octanoato de IoxinilaTriciclazolFomesafem Permetrina
Trinexapaque-etílicoFenitrotionaPiroxasulfonaFenpropimorfe
Quincloraqueparaquateamianto/asbesto

Retrocesso jurídico

No âmbito jurídico, é apontado que a lei nº 15.671/2021 fere a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, quando reduz, em descompasso com a vontade do Poder Constituinte originário, o nível de proteção destes direitos fundamentais a patamares de concretização insuficiente. 

Ao permitir o aumento da comercialização e uso de veneno, o Estado do Rio Grande do Sul afronta decisão do STF, que entende que os Estados só podem aumentar as restrições do uso de veneno do que já é permitido por lei nacional, e não menos.

Para a juíza Cíntia Mua, representante da Escola Superior da Magistratura (Ajuris) no Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos (FGCIA), coordenou a equipe jurídica e científica que elaborou a ação e explicou que o principal objetivo da petição foi trazer aporte científico. 

“A petição se constituiu em mais de 80 páginas, a maior parte delas ciência pura. Nós tivemos um grupo de juristas e um de cientista trabalhando nessa iniciativa. Os cientistas foram abnegados porque entregaram a causa inclusive estudos que ainda não estavam publicados”, garantiu a jurista.  

Na avaliação da juíza, a articulação entre várias entidades para a proposição da ação colabora para o esclarecimento da Corte sobre os impactos que essa alteração legislativa determinou no estado do Rio Grande do Sul. “Isso significa uma coesão importante na direção da sustentabilidade e nos objetivos do desenvolvimento sustentável”, completou.    

Entidades estavam mobilizadas desde 2020 contra o retrocesso na lei de agrotóxicos gaúcha – Frente Cidadã Contra os Agrotóxicos/ Divulgação

Retrocesso social

Desde 1982, o Rio Grande do Sul contava com a lei estadual nº 7.747/82 (Lei dos Agrotóxicos), que proibia a comercialização e o uso de agrotóxicos obsoletos e banidos em seus países de origem (sendo a maioria da União Europeia). Em 2021, o atual governador Eduardo Leite (PSDB), aprovou a nova lei dos Agrotóxicos (lei nº 15.671/2021), que tramitou pela Assembleia Legislativa gaúcha em regime de urgência, impossibilitando a realização de audiências e debates públicos sobre tema crucial para a saúde do povo gaúcho.

Contestando a decisão do Governador em liberar mais veneno na produção agrícola, mais de 200 entidades alertaram que o Rio Grande do Sul deixava de ser o pioneiro na proteção e controle de agrotóxicos e se tornava a vanguarda do retrocesso, impactando na saúde, no meio ambiente, na produção e na qualidade dos alimentos.

Retrocesso ambiental

A liberação de mais 37 tipos de veneno na produção agrícola gaúcha, coloca em risco os ecossistemas do Rio Grande do Sul, como a poluição do solo, a contaminação da água e a vida animal e vegetal. 

Conforme aponta o levantamento das entidades, a liberação de mais leva de agrotóxicos vai impactar mais ainda a agricultura gaúcha, que já sofre com altos índices de substâncias nocivas à saúde humana

Retrocesso na saúde

Conforme apontam os estudos sobre o impacto de agrotóxicos na saúde humana e não-humana. A liberação destes novo rol de veneno vai agravar a incidência de problemas de saúde agudos, crônicos e subcronicos. “Vamos ter uma maior incidência de intoxicações, má formação fetal, neoplasia, distúrbios endócrinos, neurológicos, cardíacos, pulmonares e respiratórias, além de doenças do tipo neurológico e psiquiátricos, como depressão, o que invariavelmente resulta em um impacto imensurável à população e, consequentemente, sobrecarga ao Sistema Único de Saúde”, destaca Cláudio Augustin, presidente do CES-RS.

Quando associado às sequelas causadas pela contaminação da Covid-19, a saúde humana pode ser agravada com a ingestão de alimentos ou água contaminados. “O pós-contágio engloba sequelas presentes nos sistemas respiratório, nervoso central e distúrbios neurocognitivos, de saúde mental, metabólicos, cardiovasculares, gastrointestinais, mal-estar, fadiga, dor musculoesquelética e anemia”, como aponta o Amicus Curiea. 

Amicus Curiae

O Amicus Curiae dos agrotóxicos, é a primeira ação movida com essa temática no Rio Grande do Sul, e tem como objetivo trazer elementos técnicos para colaborar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 6955), movida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) contra a liberação de agrotóxicos no RS.

Iniciada em janeiro de 2020, o Amicus Curiae expressa a preocupação das seis entidades com o tema sobre o veneno na alimentação dos brasileiros, e visa colaborar com o debate de relevante repercussão e interesse social. “É a primeira vez na história que as associações acumulam forças e entram com uma ação de amicus curiae no Supremo Tribunal Federal (STF), para colaborar em elementos técnicos, que acumulam o conhecimento em Direitos Humanos, Saúde, Nutrição e Segurança Alimentar e jurídica de ponta, direitos fundamentais”, destacou Júlio Alt, presidente do CEDH-RS.

A peça jurídica que aborda temas como agrotóxicos proibidos na Europa, a contaminação das águas no Rio Grande do Sul, e correlação do agrotóxicos com transtornos como de Espectro Autista será recebida pelo Ministro Relator da ação, Dias Toffoli do Supremo Tribunal Federal, e aguarda data para julgamento da ADI.

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