Se entrasse em vigor, os agrotóxicos poderiam ser registrados e liberados automaticamente em 60 dias, caso as análises necessárias não fossem concluídas pelos técnicos do Ministério no prazo. Seria mais uma medida do Ministério da Agricultura em defesa dos interesses das grandes multinacionais agro-químicas
por Nilto Tatto, Deputado federal (PT-SP) e membro titular da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara
Parabenizo o Ministro Henrique Ricardo Lewandowski, do Superior Tribunal Federal (STF), pela decisão de conceder liminar impedindo a entrada em vigor da Portaria 43/2020, do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA). A decisão é resultante de uma ação protocolada pelo PSol.
Se entrasse em vigor, os agrotóxicos poderiam ser registrados e liberados automaticamente em 60 dias, caso as análises necessárias não fossem concluídas pelos técnicos do Ministério no prazo. Seria mais uma medida do Ministério da Agricultura em defesa dos interesses das grandes multinacionais agro-químicas, em detrimento à saúde da população e da preservação do meio ambiente.
Este seria mais um absurdo da gestão Bolsonaro que em pouco tempo já tornou-se o governo que mais liberou registros de agrotóxicos na história do Brasil. Dada a importância da decisão, tomo a liberdade de transcrever abaixo o texto conforme registrou o Ministro em seu voto:
“Como se sabe, situações excepcionais exigem soluções excepcionais. A hipótese, à toda a evidência, está a exigir a prolação de uma decisão monocrática urgente para resguardar, sem mais delongas, a população brasileira do insidioso perigo representado pela liberação indiscriminada de agrotóxicos e outros produtos químicos na natureza.
Essa providência se torna ainda mais necessária e urgente diante da terrível pandemia que assola o Brasil e o mundo, decorrente da incontrolada e rápida propagação do Covid – 19, em meio à qual o nosso país já contabiliza milhares de infectados e dezenas de mortos, número este que não para de crescer. Parece-me, portanto, imperioso impedir que a Portaria atacada nesta ADPF produza seus efeitos, acrescentando mais um agravo à saúde pública, que se encontra sob severo risco neste momento.
Não é possível, salvo melhor juízo do Plenário do STF, admitir-se a liberação tácita de agrotóxicos e produtos químicos, sem uma análise aprofundada, de cada caso, por parte das autoridades de vigilância ambiental e sanitária. Placitar uma liberação indiscriminada, tal como se pretende por meio da Portaria impugnada, a meu ver, contribuiria para aumentar ainda mais o caos que se instaurou em nosso sistema público de saúde, já altamente sobrecarregado com a pandemia que grassa sem controle.”
Aproveito para destacar algumas das inúmeras ações do governo federal adotadas em 2019 com a intenção de flexibilizar o uso de agrotóxicos. Ainda no inicio daquele ano, o primeiro do mandato de JAir Bolsonaro, foi desativado o Comitê Técnico de Assessoramento de Agrotóxicos (CTA), constituído pelo Decreto 4.074 de 4 de janeiro de 2002. O CTA era o espaço onde IBAMA, ANVISA e MAPA nivelavam procedimentos relacionadas a saúde, ao meio ambiente e eficiência agronômica do venenos.
Com a extinção do CTA, o MAPA passou a centralizar o registro de agrotóxicos no País. Ação concreta desta alteração foi a liberação de 503 novos agrotóxicos em 2019. Ainda naquele ano, foi alterada a classificação toxicológica dos venenos, mais uma afronta a saúde e ao meio ambiente, ação tomada para atender interesses meramente econômicos. Venenos que eram classificados pela irritação na pele ou olhos, que é um primeira manifestação da intoxicação, por exemplo, foram classificados como menos tóxicos ou praticamente sem toxicidade, deixando de ser analisada a irritação de peles e olhos.
Com a decisão, mais de 80% dos agrotóxicos tiveram suas classificações alteradas para menos tóxicos, incluindo o Glifosato, o agrotóxico mais consumido no Brasil e com inúmeras evidências científicas de males à saúde e ao meio ambiente. Esse veneno já acumula inúmeras ações na justiça de diversos países, inclusive nos EUA, onde a justiça tem dado ganho de causas para as pessoas que sofreram as consequências do seu uso, adquirindo doenças como o câncer, entre outras.
Atualmente, em plena pandemia de Coronavírus, o MAPA toma uma decisão inconsequente de liberar mais agrotóxicos. O ato número 26, de 01/04/2020, publicado no dia 03 de abril, liberou mais 46 novos agrotóxicos. A decisão do Ministro Lewandowski, resgata, portanto, a importância do debate sobre o modelo de produção de alimentos que queremos para o nosso País.