Escola no Ceará é exemplo de “resistência ativa através da educação”

Escola Família Agrícola (EFA) desenvolve caminhos contrários ao modelo de desenvolvimento feito pelo agronegócio

Por Daniel Lamir, no Brasil de Fato

“Por que preciso aprender isso?” Essa é uma das perguntas mais frequentes por quem questiona o sentido da educação. E imaginando as diversidades presentes no semiárido brasileiro, como um plano metodológico tentaria responder essa questão?

A Escola Família Agrícola (EFA) Jaguaribana Zé Maria do Tomé, localizada em Tabuleiro do Norte (CE), segue desde 2018 desenvolvendo a Pedagogia da Alternância.

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A proposta busca favorecer os sentidos educacionais não apenas de quem frequenta as aulas, mas de transformação do território. A EFA está localizada na região cearense que possui a maior disponibilidade hídrica do estado, o Vale do Jaguaribe, formado por 15 municípios.

De acordo com levantamento da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a região sofre impactos diretos causados pelo monocultivo e utilização massiva de agrotóxicos.

A instalação de empreendimentos do agronegócio alterou o uso e ocupação da terra, além do veneno agrícola causar intoxicações humanas e contaminações ambientais. 

Por outro lado, para Leandro Cavalcante, educador e colaborador da EFA Jaguaribana Zé Maria do Tomé, a educação se soma à luta de organizações e movimentos que atuam pela sustentabilidade da vida no território. 

“Existem os movimentos que atuam na ocupação das terras, como é o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], o MAB [Movimento dos Atingidos por Barragens], a CPT [Comissão Pastoral da Terra], o movimento de luta pela água, como é o caso da Cáritas Diocesana. E a EFA contempla, trazendo grande contribuição para essa resistência ativa através da educação, mostrando que um outro modelo de produção no Vale do Jaguaribe é possível, centrado na agroecologia, no bem viver com o Semiárido, na convivência com o semiárido, nas boas práticas com o solo, com a água, com os animais, com a natureza e entre os seres humanos”, defende. 

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Essas e outras pautas fazem parte da teoria, da prática e da ludicidade na Pedagogia da Alternância desenvolvida na EFA.


A educanda Nayane Bezerra está na turma do 3º ano da EFA Jaguaribana Zé Maria do Tomé / Alisson Chaves

Seguindo toda a base curricular do Ensino Médio, a proposta adentra a categoria de Educação Comunitária, com educandos e educandas que buscam caminhos contrários ao da exploração da mão de obra juvenil, por exemplo. 

A educanda Nayane Bezerra optou pelo desenvolvimento de hortas agroecológicas, a partir das trocas de conhecimentos na EFA Jaguaribana. Ela tem 21 anos e mora em Potiretama, um dos municípios do Vale.   

“O projeto ‘As hortas’ começou por conta do PVFC, que é o Projeto de Vida da Família Camponesa – que é o Projeto de Conclusão de Curso. Daí tive a ideia de fazer as hortas para poder ganhar um dinheirinho e fornecer verduras para a comunidade e também para cidade”, destaca.  

Apesar de ter iniciado as atividades em 2018, a EFA Jaguaribana possui uma diversidade de educandos e educandas que vai para além de quem opta por permanecer no campo.

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Adelita Chaves, da coordenação pedagógica da escola, afirma que as origens das pessoas matriculadas neste momento contempla o público da agricultura familiar, acampamentos, assentamento e jovens da cidade. 

“Essa busca por uma escola com educação diferenciada, do campo, com base na agroecologia, com a convivência com o semiárido, a partir de Paulo Freire e buscando o Bem Viver também está sendo procurada por jovens da cidade, que passam por essa mesma realidade de não mais conseguirem se encontrar nas escolas convencionais”, afirma.  

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Adelita destaca ainda que algumas pessoas procuram a escola mesmo quando já estão com o ensino médio concluído. 


Zé Cláudio afirma que passou a gostar mais de animais e da natureza como um todo a partir da EFA Jaguaribana / Alisson Chaves

José Cláudio, tem 31 anos, e mora no município de Tabuleiro do Norte e faz comparações entre o ensino convencional e os processos na EFA Jaguaribana.

A formação integrada com o processo técnico, está resultando em projetos para o reuso da água e a produção diversificada de alimentos.

“Tudo é totalmente diferente. Não é só jogar as atividades e pedir as respostas para os alunos. Temos o diálogo e a liberdade de debater com os professores os assuntos”. 

A EFA Jaguaribana carrega o nome e a memória de uma liderança que deu a vida na luta contra os agrotóxicos na região. Zé Maria do Tomé é também o nome da lei que atualmente proíbe a pulverização área com agrotóxicos em todo o estado do Ceará.

Os educadores e educadoras da EFA Jaguaribana Zé Maria de Tomé atuam de forma voluntária. E a instituição busca sustentação a partir de editais e doações

Edição: Douglas Matos

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