Governo Bolsonaro tem recorde de mortes e de agrotóxicos

‘Enquanto milhares de trabalhadoras e trabalhadores estiverem sofrendo os males das contaminações, estaremos tomados por uma necropolítica’

Artigo de Juliana Acosta e Fernando Carneiro publicado originalmente na Carta Capital

Os recordes do governo Bolsonaro não se limitam ao número de mortes na pandemia. Outra marca inédita são os 1.059 registros de agrotóxicos desde janeiro de 2019. Destes, cerca de um terço é proibido na União Europeia por conta dos riscos à saúde e ao meio ambiente. Os potenciais danos à saúde humana e ao ambiente são sinalizados pelos dados do Ministério da Saúde e da Anvisa: um quarto dos municípios brasileiros possuem um coquetel de 27 agrotóxicos na água; 51% dos alimentos que chegam à nossa mesa contêm resíduos de agrotóxicos; e entre 2010 e 2020, 1.987 pessoas perderam suas vidas por intoxicação aguda de agrotóxicos, o que é sabidamente uma informação subestimada, afora as doenças crônicas decorrentes do uso desses venenos.

A atual conformação do Congresso Nacional e do Governo Federal, dominados pelos setores mais atrasados do agronegócio, tende a levar o Brasil para um rumo cada vez mais tóxico. É o mesmo caminho que o governo Bolsonaro escolheu para lidar com a Pandemia: o do negacionismo científico e da priorização de uma economia sem povo, no qual se coloca uma falsa polêmica entre salvar vidas ou negócios. Não existe economia sem pessoas. Enquanto milhares de trabalhadoras e trabalhadores deste País, bem como toda população consumidora de alimentos, estiverem sofrendo os males das contaminações por agrotóxicos, estaremos tomados por uma necropolítica, que se alimenta de nuances verdadeiramente genocidas.

A passos largos na liderança no ranking mundial de consumo de agrotóxicos, o Brasil se confronta em uma encruzilhada ética: seguir campeão no uso dos venenos ou reposicionar seu modelo produtivo. Existe o caminho do “Pacote do Veneno” (PL 6.299/2002)), que está para ser votado no Plenário da Câmara Federal, e visa flexibilizar o arcabouço regulatório de agrotóxicos no Brasil, retrocedendo ainda mais na perspectiva de proteção à saúde e ao ambiente. Existe também o caminho oposto, da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos – PNARA (PL 6.670/2016), que também aguarda votação e abre uma avenida de possibilidades para o Brasil se transformar no maior produtor de alimentos saudáveis do mundo, protegendo seu povo e sua biodiversidade. A Abrasco, a Associação Brasileira de Agroecologia-ABA e a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida irão lançar um Dossiê contendo farto e aprofundado material sobre o assunto.

Neste ano no qual a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida completa uma década, é preciso reafirmar a defesa do SUS, da vacinação, do auxílio emergencial e de ações comprometidas com a vida. É urgente também questionar o modelo predatório que produziu a pandemia e seguirá produzindo outras doenças, caso não modifiquemos a forma de nos relacionar com a natureza. É como escreveu o poeta Pedro Tierra: “O sonho vale uma vida? Não sei. Mas aprendi da escassa vida que gastei: a morte não sonha”. É preciso darmos um grito: por uma agricultura sem venenos, com justiça social e que gere saúde.

*Fernando Ferreira Carneiro é pesquisador da Fiocruz, membro do Grupo Temático Saúde e Ambiente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO, e da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida

**Juliana Acosta Santorum é integrante da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida

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