Para atender aos interesses do agronegócio, medida contraria princípios da Lei Federal de Agrotóxicos e expõe população a riscos no estado que já é o maior consumidor de agrotóxicos do Brasil
Publicada no Diário Oficial do Mato Grosso na última quinta-feira (16), a Lei nº11.118/2020 autoriza que técnicos agrícolas de nível médio prescrevam e vendam agrotóxicos em todo o estado. Comemorada pelo Conselho Federal dos Técnicos Agrícolas como “vitória dos profissionais e o fim das restrições ao profissional”, a alteração na Lei 8.588/2006 expõe a população a riscos, ao flexibilizar a emissão do Receituário Agronômico a técnicos sem a devida formação e capacidade para recomendar agrotóxicos, como denuncia a Confederação dos Engenheiros Agrônomos do Brasil (CONFAEAB).
A entidade manifestou publicamente sua preocupação e repúdio à Lei nº 11.108 diante das autoridades e lideranças do setor produtivo do estado do Mato Grosso, reforçando que a medida atenta contra a ciência e o Princípio da Precaução e também agride princípios da Lei Federal de Agrotóxicos (nº 7.802/1989), que estabelece a necessidade de profissional legalmente habilitado, bem como enumera condutas sujeitas a sanções e punições.
A Confederação reforçou que, de forma equivocada, a permissão é concedida a profissionais com formação de curta duração e sem os conhecimentos científicos básicos: “É inquestionável que para uso e recomendação de tais produtos é necessário o conhecimento aprofundado em química, em especial a orgânica e a ambiental, no conhecimento minucioso em fisiologia vegetal, dinâmica do solo, conhecimento climatológico e estudo sólido sobre as espécies alvo dos agrotóxicos (insetos, microrganismos, plantas invasoras, entre outros) e suas interações ambientais. Assim, externamos nossa indignação pela rápida aprovação do citado instrumento legal, o que reflete ausência do devido cuidado com a responsabilidade técnica com base na formação profissional”, afirma o documento.
Mato Grosso lidera o consumo de agrotóxicos no Brasil e é onde foram encontrados vestígios de agrotóxicos considerados altamente tóxicos e cancerígenos – trifluralina, atrazina, metolacloro e metribuzim – na água de chuva e em poços artesianos de escolas rurais e urbanas de quatro municípios. Em Cuiabá e outras 29 cidades do estado as águas estão contaminadas por um “coquetel de veneno”, tendo sido detectados todos os 27 pesticidas obrigatórios de serem testados, 16 destes classificados pela Anvisa como extremamente ou altamente tóxicos e onze associados ao desenvolvimento de doenças como câncer, malformação fetal, disfunções hormonais e reprodutivas.