Sintoma de desequilíbrio ecológico, novo foco de gafanhotos atinge Rio Grande do Sul

Por Pedro Neves Dias
Do Brasil de Fato

Um novo foco de gafanhotos está se manifestando na região noroeste do Rio Grande do Sul, se alimentando principalmente de matas nativas, ainda não atingindo lavouras. A informação foi confirmada pela Defesa Agropecuária do Estado do Rio Grande do Sul, órgão ligado à Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural. Segundo o fiscal agropecuário André Ebone, há grande desfolhamento em área de mata nativa na região onde se concentra o foco de gafanhotos, entre os municípios de São Valério do Sul e Santo Augusto.

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A Defesa Agropecuária gaúcha realizou um sobrevoo na área e estimou que há cerca de 20 a 30 hectares de mata nativa com severos danos, dentro da Reserva Indígena Inhacorá: “Notamos que os danos se concentram na mata contínua, não sendo observados em outros remanescentes, devido à interrupção ocasionada pelas áreas de lavoura”, afirma o fiscal.

Além da vistoria aérea, outra equipe, em terra, verificou que os gafanhotos também estão sendo encontrados em áreas de lavoura, porém, com pouco ou nenhum dano. Apesar disso, as áreas vistoriadas de mata nativa estão “severamente danificadas”, afirmou outro fiscal da Defesa Agropecuária, Alonso Andrade. Além disso, chamou a atenção da equipe o fato da devastação atingir especialmente exemplares de Timbó, uma planta nativa.

Agrotóxicos e agricultura predatória são fatores de risco

Segundo o engenheiro agrônomo, membro da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e do Movimento Ciência Cidadã, Leonardo Melgarejo, o gafanhoto deste novo foco aparenta ser de uma espécie diferente daquela que se proliferou no estado no primeiro semestre de 2020. A atual, argumenta, aparenta não ser tão voraz, mas foi empurrada novamente para o estado pela mesma causa: o ecocídio causado pelos agrotóxicos.

Segundo o coordenador da Frente Parlamentar Gaúcha em Defesa da Alimentação Saudável, deputado Edegar Pretto (PT), registrado em audiência pública, o uso de agrotóxicos piora a qualidade da produção de alimentos, coloca em risco a saúde da população e aumenta os problemas de intoxicação. Além disso, segundo Melgarejo, da forma como se usa os agrotóxicos atualmente, há um favorecimento para a aparição de mais problemas com infestações e enxames de insetos. Na sua opinião, essas manifestações anormais são sintomas de desequilíbrios no meio ambiente.

Ele atentou para o fato descrito pela Defesa Agropecuária do RS, de que, dessa vez, os insetos estariam se alimentando e devastando principalmente o Timbó, uma planta bastante comum na região. O engenheiro informou que é do Timbó que se extrai a rotetona, elemento utilizado como um inseticida natural: “Os pesticidas orgânicos […] são de baixa toxidade e de curta permanência no ambiente. Neste grupo estão as rotenonas, extraídas do timbó ou tingui (planta usada por índios brasileiros em arpões para pegar peixes)”, afirma pesquisa científica.

Melgarejo destaca que a possibilidade do uso contínuo de agrotóxicos nas lavouras está empurrando novos enxames de insetos para se alimentarem de matas nativas. Dessa vez, eles estão se alimentando de uma planta utilizada como um pesticida natural, provavelmente se fortificando e adquirindo resistência a outros tipos de inseticidas. “Coincidindo com a questão da seca e as estações cada vez mais quentes, tende a tornar estes problemas mais graves e mais frequentes. A saída está na agroecologia“, afirma.

Eduardo Leite está indo na contramão

Contrariando esta lógica e incentivando crises futuras, o governo do RS enviou o Projeto de Lei 260/2020, de autoria do próprio governador Eduardo Leite (PSDB), para tramitar em regime de urgência na Assembleia Legislativa, o que significa que este PL deve trancar a pauta a partir do dia 15 de dezembro. O PL propõe alterar a Lei dos Agrotóxicos, de 1982, liberando no estado o uso de agrotóxicos proibidos em seus países de origem.

Este projeto, muito alinhado à política do governo Bolsonaro, favorece os grandes latifundiários que dependem de altas quantidades de agrotóxico para manter o ritmo de produção de commodities, principalmente para exportação. Nesse sentido, para o professor Silvio Porto, a atual política do governo federal privilegia o crescimento das commodities, em detrimento dos alimentos. Segundo o professor, da forma como as monoculturas como a soja são plantadas no Brasil, não deveriam ser chamadas de alimento.

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Para Melgarejo, a utilização de produtos químicos na agricultura não aumenta a quantidade de alimentos. De acordo com o agrônomo, existem muitos exemplos de produção agroecológica: algodão, soja, cana, eucalipto, feijão, batata, mandioca e arroz, por exemplo. Ele sustenta ainda que políticas de reforma agrária, com incentivo à produção agroecológica, com lavouras sustentáveis, pode produzir alimentos saudáveis com preços acessíveis à população, prevenindo todos os problemas da saúde humana e da terra derivados do uso de agrotóxicos.


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Edição: Marcelo Ferreira e Rogério Jordão

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