ADI questiona lei que autoriza uso de agrotóxicos que estavam proibidos no RS

Por Iris Pacheco
Da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos

Nesta terça-feira, 03, o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) propuseram Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a constitucionalidade da Lei nº 15.671, de 27.7.2021 do estado do Rio Grande do Sul, que alterou a Lei Estadual de Agrotóxicos (7.747/1982), liberando o uso no território gaúcho de agrotóxicos proibidos nos países em que são fabricados. 

O projeto conhecido como o PL 260/2020, de autoria do governador Eduardo Leite (PSDB), foi aprovado no plenário da Assembleia Legislativa no dia 29 de julho, por 37 a 15 votos contrários. Sem possibilidade de debate com a sociedade foi encaminhado em regime de urgência no dia 29 de junho à Assembleia Legislativa. Sancionado pelo governador no final de julho, agora basta o registro do agrotóxico junto ao órgão federal competente bem como do cadastro nos órgãos competentes estaduais.  

O governador Eduardo Leite e os representantes do agronegócio na ALERG se alinham politicamente ao governo Bolsonaro e sua equipe de devastação ambiental, que têm o lucro acima da vida. Seguem a cartilha do desgoverno federal principalmente quando o tema é o pacote do veneno e a defesa dos interesses do agronegócio brasileiro. Passam a boiada, mesmo que prescinda da saúde do povo 

Segundo o Doutor em Direito pela UFSC, advogado popular da RENAP, Emiliano Maldonado, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6955) ajuizada ontem no Supremo Tribunal Federal (STF), demonstra que a sociedade civil gaúcha não aceita os graves retrocessos socioambientais que o governador Eduardo Leite tem promovido nos últimos anos no Rio Grande do Sul. 

“A lei n. 7.747/82 é um marco da luta pela alimentação saudável e contra a comercialização de agrotóxicos que são proibidos na Europa e Estados Unidos pelos seus riscos à saúde pública e à natureza. Infelizmente o atual governo do RS desconsiderou as comprovações científicas dos danos que essas substâncias produzem, aprovou a Lei 15.671/21, em regime de urgência, impedindo a ampla participação da sociedade e, sobretudo, contrariando as posições das áreas técnicas da FEPAM e da área técnica da secretaria da saúde. Diante disso, a ADI aponta que essa mudança é inconstitucional e configura  violação aos artigos 5º, LIV e LV, 6º, 7º, XXII e 225, da Constituição Federal de 1988”, denuncia. 

Em dezembro de 2020, mais de 240 entidades da sociedade civil se organizaram e por meio da Carta aberta mais vida, menos veneno, protocolaram um pedido ao Governador do Estado para retirada do regime de urgência e manutenção da  Lei Estadual de Agrotóxicos originária (7.747/1982). A iniciativa do PSOL e do PT conta esse apoio social, que segue em mobilização permanente contra os agrotóxicos. 

Nesse sentido, Heverton Lacerda, presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), afirma que o processo que originou a Lei Estadual nº 15.671, de 27/07/2021, não corresponde aos anseios da população no que se refere à produção de alimentos saudáveis para a população gaúcha. Ao contrário, defende os interesses de multinacionais produtoras de venenos agrícolas e de um pequeno grupo de empresários que muito lucram com o atual modelo do agronegócio, nocivo à saúde, ao ambiente natural e às contas públicas do Estado. 

“Esses mesmos empresários têm o poder de influenciar o governo e parte dos parlamentares que se beneficiam da relação. Lamentamos que o nosso estado, até então referência na legislação que protegia os gaúchos contra agrotóxicos proibidos em seus países de origem, tenha regredido através de posicionamentos políticos contestáveis e duvidosos. Acreditamos que a população gaúcha – cidadãos e entidades – deva se mobilizar para apoiar a ADI”, provoca  Heverton. 

Entre as tantas irregularidades do processo, a Ação Direta de Inconstitucionalidade protocolada no STF ainda assinala que, o PL 260 foi encaminhado para a Assembleia Legislativa sem que fossem observadas as manifestações técnicas produzidas pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (Fepam) e pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde. Os autores da ação citam:

“A FEPAM, órgão responsável pela fiscalização e pelo licenciamento ambiental, assim como pela realização do cadastro de agrotóxicos no Estado do Rio Grande do Sul, ao analisar o então PL 260, se manifestou de forma contrária ao seu prosseguimento. O referido órgão entendeu que o mesmo “caracteriza retrocesso ambiental e potencialização de riscos para a saúde pública no Estado, em um momento em que a maioria dos países avança em cuidados com o planeta, para o bem das gerações atuais e futuras.” Do mesmo modo, o parecer elaborado pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde, vinculado à Secretaria Estadual de Saúde, foi desfavorável à alteração legislativa.” 

Ou seja, a Assembleia Legislativa do RS desconsiderou a gravidade da flexibilização legislativa e os riscos à saúde humana e à natureza ocasionados pela permissão de uso de substâncias altamente tóxicas que não possuem autorização de uso em seu país de origem. 

A Lei Estadual nº 15.671/21, apresentada pelo governo Eduardo Leite altera a Lei dos Agrotóxicos n° 7.747 /1982, que é considerada um marco pioneiro no país, uma vez que foi a primeira norma do país a regular a comercialização e distribuição de agrotóxicos. Entre outros dispositivos, ela condicionava o registro de agrotóxicos importados à comprovação da autorização do uso no país de origem. A lei gaúcha abriu o marco normativo inclusive para a construção da Lei Federal de Agrotóxicos em 1989 (Lei 7.802/1989).

Um exemplo dessa ação é que a população gaúcha ficou livre de consumir agrotóxicos como o Paraquat (proibido em 27 países que compõem a União Europeia, inclusive na Inglaterra, onde é produzido), que só foi banido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2020. Apesar disso, de forma controversa, a Diretoria Colegiada da Anvisa liberou o uso dos estoques do agrotóxico até 2021, mesmo diante do grande número de evidências da gravidade de seus danos.

O Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Estima-se que, em pouco mais de dois anos de mandato do governo Bolsonaro (Sem Partido), tenha sido liberado mais  de 30% dos agrotóxicos já autorizados no país até hoje, mais de 1.300 substâncias tóxicas, maioria proibidas em seus países de origem e sem nenhum estudo prévio sobre os impactos dela sobre a população brasileiro e o meio ambiente.  

Nesse sentido, há uma intensa mobilização social nessa causa pelo Projeto de Lei 6670/2016 que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNaRA), garantindo a redução dos agrotóxicos no Brasil, mais saúde para a população e um ambiente sadio para se produzir comida de qualidade. 

Por meio da plataforma Chega de Agrotóxicos sua assinatura pode ajudar a pressionar o  judiciário para que ele zele pelo princípio da precaução e evite esse grave retrocesso em matéria socioambiental é o que nos cabe nesse contexto de morte. 

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